terça-feira, 30 de outubro de 2007

Enchente é coisa de pobre

Dá pra ouvir o som dos pingos da chuva batendo forte no telhado da casa simples, sem laje, que fica à beira do rio. O barulho é tão forte que se confunde com o som da TV, único elo de ligação daquele morador e sua imensa família, pai, mãe e 6 filhos e de quebra a sogra, com o mundo dos sonhos e da fantasia. É assim mesmo a vida deles, vivendo vendo a vida bonita que os belos e as belas atrizes apresentam nas novelas.
É uma chuva forte de verão, logo vai passar. E se não não passar, vamos rezar pro rio não transbordar; pensamento já automático dos pais daquelas crianças, toda vez que a chuva é forte e se estende por um período mais longo.
O Prefeito da cidade, ao assumir o cargo, prometeu mandar limpar o rio que serve de escoamento e depósito de todo o lixo daquelas humildes casinhas à sua margem, só que até hoje não cumpriu a promessa. Promessa ou dever? Bem, ele já está eleito, então é provável que seja promessa mesmo, seria dever se ainda fosse candidato. Já estamos acostumados com isso também, agora nossa esperança é nas próximas eleições aparecer um outro candidato bom em promessa dos deveres de um governante sério, que não deveria prometer o óbvio
A chuva continua caindo, e parece que tão cedo não pára, é a impressão que se tem naquele momento. Para previnir o pior repete-se a rotina mais adequada ao momento: levantar os móveis, a cama, a geladeira, enfim, tudo o que for possível, numa altura que provavelmente conservará os utensílios domésticos essenciais, conquistados ao longo dos anos, com muito trabalho, quase tudo comprado à prestações a perder de vista.
As horas passam e a chuva não, será um dilúvio? A angústia toma conta da família, não podemos pensar mais no supérfluo, a sobrevivência agora é o mais importante. Deus nos dará força e coragem para adquirir o que não conseguirmos salvar de material. Sem cama, sem geladeira, sem TV, a gente vive, precisamos salvar nossa pele, a água já está entrando dentro de casa e a chuva continua, cada vez mais forte.
E o drama daquela família retrata o mesmo de outras ao longo daquele rio que a muitos anos atrás era limpo, bem conservado. As suas águas fluiam serenas e calmas, porque era tratado e cuidado somente pela natureza, não havia tanta sujeira como hoje, o mato era a única coisa que crescia nas suas margens. Admitamos também que poucas casas haviam por ali, porém a necessidade e o baixo poder aquisitivo do povo, por não ter onde morar com dignidade, é obrigado a se amontoarem em pequenos casebres, em condições precárias de saneamento básico.
O sentimento de humanidade, de fraternidade, de respeito com vida dos menos favorecidos, com o progresso, o crescimento econômico, a ganância de alguns, foi perdendo seus valores. O rico, o poderoso, o que tem o poder e dever de cuidar do povo, porque foi eleito pra isso, está muito ocupado em preparar o seu marketing para a próxima eleição.
E ele sabe que os que conseguirem escapar com vida desta fatalidade, a esquecerão e vestirão a sua camiseta de campanha, acreditando que desta vez a sua promessa será cumprida; o rio será finalmente cuidado como é possível ser. tirando-os, pelo menos, deste sofrimento, os outros a gente aguenta, Deus ajuda.
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